Heranças e identidade

São relevantes os projetos que atualmente buscam proporcionar à população o conhecimento de sua herança cultural, a partir do viés da diversidade cultural brasileira como traço fundamental da própria identidade. 

O projeto ‘Paraíba Grandes Nomes ’possui este objetivo: levar os estudantes a reconhecerem, em seu universo social, a diversidade cultural por meio de alguns indivíduos e cultivar a memória como um valor de conhecer melhor a si mesmo.

Segundo Chauí (2005, p.138) "memória é uma evocação do passado. É a capacidade humana para reter e guardar o tempo que se foi, salvando-o da perda total. A lembrança conserva aquilo que se foi e não retornará jamais". 

Assim, um projeto que trabalha a memória utiliza-se da lembrança do que já passou, mas aponta para as potencialidades de um futuro que se deseja construir.

Dentre os personagens abordados no projeto, encontram-se conhecidos como Ariano Suassuna, Sivuca, José Lins do Rego, Jackson do Pandeiro, Pedro Américo, Augusto dos Anjos e outros esquecidos da história. Saber o porquê, dentre inúmeros indivíduos, especificamente, esses se destacaram é perceber que suas obras vieram do passado, permanecem no presente e carregadas de intencionalidade, estarão dentro de cada apreciador construindo uma ponte até o futuro. É justamente em razão do elemento de identidade, seu registro e difusão que a memória coletiva passa a fazer parte da memória individual. Aí reside a relevância dessa ação: o apreciador do projeto se apropria do coletivo como indivíduo.


Para difundir o que fizeram esses heróis, os quais foram pessoas reais, o projeto evoca a tradição da literatura de cordel e da xilogravura. 

A xilogravura, que tradicionalmente ilustra o cordel desde a década de 1920, dá forma ao retrato dos personagens, como sempre fez em seu universo imagético,materializando a figura do herói, sua feição e identidade.

A literatura de cordel —versão tipografada de longa tradição oral — resgata a poesia popular nordestina que brilhava nos desafios dos repentistas, dessa vez contando a biografia e os feitos do personagem no texto impresso, cumpre o papel de resgatar e recontar aquilo que será referência na construção de nossa identidade.

‘Paraíba Grandes Nomes’ apresenta,dentre muitos personagens relevantes,Leandro Gomes de Barros que foi o primeiro grande poeta do cordel e responsável pela difusão dessa arte nos sertões da Paraíba, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte. (Costella,1984) 

O projeto resgata o aspecto difusor da saga de Leandro, itinerando por 15 municípios, do litoral ao sertão da Paraíba. Além das mostras em alguns municípios, acontecem oficinas de xilo e literatura, ministradas pelos artistas Josafá de Orós e Manoel Monteiro.

A mostra, constituída por banners, facilita a itinerância e também dialoga com os novos caminhos da gravura, pois o próprio cordel, já desde o século passado, passou a ser impresso em gráficas modernas, apropriando-se de novos meios de reprodução, assim como os artistas atualmente se valem de folders, cartazes e internet para divulgar suas obras.

Nas palavras de Josafá, ‘Paraíba Grandes Nomes’ é um “projeto memorialístico”. Porém creio que,para muito além de trazer a tona uma memória, resgatando fragmentos do universo simbólico que esses personagens ajudaram a construir, o projeto valoriza nossas heranças e reconstrói nossa identidade. 

Márcia Santtos
Mestre em Artes Visuais pela Unesp, artista gravadora e coordenadora do Grupo Gravura Mariana Quito.
marciasanttos@gmail.com

Referencias bibliográficas:

COSTELLA, Antonio F. Introdução à Gravura e História da Xilogravura. Campos do Jordão: Mantiqueira, 1984.

CHAUÍ, M. Convite à filosofia. 13 ed. São Paulo: Ática, 2005.

LE GOFF, Jacques. História e Memória. 4 ed. Campinas: ed. Unicamp, 1996.

OLIVEIRA, Lucia Lippi. Cultura e Patrimônio: um guia. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2008.